sábado, 26 de abril de 2008

Um inseto no pára-brisa de Apophis

Na entrada sobre o trabalho de Nico Marquardt (Apophis, Nico e a sinuca astronômica) comentamos que segundo a NASA a colisão entre um satélite artificial e Apophis seria semelhante à de um inseto contra o
pára-brisa de um carro. Vamos pôr nûmeros para compreender melhor isto.

Consultando a página da NASA com dados sobre Apophis vemos que sua massa* estimada é de 2,1 × 1010 kg ou seja 21 milhões de toneladas e que sua velocidade é de 31 km/s. Um satélite artificial geoestacionário pode ter uma massa de 1000 kg (1 tonelada) em média e sua velocidade orbital é em torno dos 3 km/s. Mais importante é comparar a energia cinética, a energia do movimento, que é definida pelo produto da massa com a velocidade ao quadrado dividido por 2. A energia cinética do satélite é 4,7 × 109 Joules ou 4,7 bilhões de Joules. Fazendo a mesma conta para o asteroide achamos que a energia deste é 9,6 × 1018 Joules ou 96 bilhões de bilhões de Joules. Comparamos agora um inseto típico de 5 g de massa e velocidade de deslocamento de 1 m/s com um carro de 1 tonelada de peso a 60 km/h (16,7 m/s). Fazendo as contas vemos que o carro possui 140.000 Joules de energia enquanto que o inseto tem 0,0025 Joules.

O que nos dizem todos estes nûmeros? A alteração no movimento do asteroide ou do carro, dependerão de quanta massa (ou melhor, energia) tem o objeto que os colide. Por isso a relação (quociente) entre massas e entre energias nos dá uma ideia de quem genera mais dano. Quanto menor é a relação (menor quociente) maior será o dano já que ambas as massas (ou energias) se parecerão. Então o carro que é apenas 200.000 vezes maior que o inseto, sofrerá um dano maior que o asteroide que é 20 milhões de vezes maior que o satélite. Em termos de energia a relação é parecida. Enquanto o carro possui 55 milhões de vezes mais energia que o inseto, o asteroide tem 2 bilhões de vezes mais energia que o satélite. Novamente o inseto seria capaz de ocasionar maior dano no carro que o satélite no asteroide. Como todos temos experiência da relevância das colisões dos insetos nos carros quando rodamos nas estradas podemos colocar os resultados da NASA en termos mais humanos.

Na verdade o relatório da NASA diz claramente que existe grande incerteza em parâmetros físicos importantes, como por exemplo a massa do asteroide, e que não espera melhorar estes indicadores até que medidas mais precisas venham a ser realizadas com telescópios ópticos em 2011 ou com radar em 2013. E embora possa parecer que Nico teve grande cuidado ao estimar o efeito de um evento tão insignificante como a colisão com o satélite artificial, é bom ressaltar que a NASA está colocando em seus cálculos, dentre outros, a influência da radiação solar (a luz que incide sobre o asteroide). A órbita de Apophis se passeia entre a da Terra e de Vênus (podem ver uma simulação aqui) mas, para sorte de todos nós, se mantém a considerável distância. Por enquanto a probabilidade de um impacto em 2029 é de 1 em 45.000 enquanto que a incerteza nas grandezas físicas não permite prever o que acontecerá 7 anos mais tarde quando em 2036 aconteça um segundo encontro muito próximo. Em uma próxima entrada prometo mostrar porqué é importante considerar a pressão de radiação (luz incidente) no cálculo da órbita do asteroide e qual é o efeito da colisão com o satélite.

Quantas vezes Apophis passou próximo da Terra? Impossível saber. Mas é um excelente exemplo dos perigos que guardam os Céus. Não é para se desesperar, mas para se manter vigiante e buscar soluções com calma.


* De uma forma aproximada pode se pensar que massa é o peso de um corpo. No entanto o peso é relativo. Quando entramos na água sentimos o empuxo que nós faz sentir mais leves. Nos elevadores, quando partem ou param, nos sentimos diferentes. Os astronautas na Lua parecem saltar mais alto que os atletas olímpicos. Por isso em física é usado o conceito de massa que é mais universal e (se não consideramos os
efeitos relativisticos) constante.

Joule é a unidade de energia no Sistema Internacional.

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