sexta-feira, 27 de junho de 2008

Tunguska, a hipótese meteorítica

Como já foi comentado anteriormente, a ideia de que em Tunguska caiu um meteorito de grandes dimensões foi a primeira hipótese levantada por Leonid Kulik na década de 1920. Mas como não acharam nem meteoro, nem cratera, foi perdendo fólego e durante décadas se prefiriu pensar em um cometa.

A situação mudou em 1983 quando Z. Sekanina publicou um trabalho muito extenso titulado "The Tunguska Event: no cometary signature in evidence" (O evento Tunguska: sem evidências de um cometa), trabalho publicado na revista Astronomical Journal. A posição de Sekanina é de que um bólide ingressando a 30 ou 40 km/s suportaria presões de mais de 1.000.000 de hectopascais ou aproximadamente mil atmosferas se atingisse a altura de 10 km. Um cometa é mais ou menos um floco de neve gigante, portanto conclui Sekanina, seria impossível, ele teria explodido muito acima do solo e assim sua energia não teria provocado tamanha destruição. Pelo contrário ele utiliza outros eventos registrados para extrapolar qual teria sido a pressão suportada pelo objeto que caiu em Tunguska. Essa pressão, próxima a duzentas atmosferas (200.000 hectopascais) se corresponde com um objeto entrando com uma velocidade de 10 km/s de onde se infere que deveria ter sido um asteróide (os cometas são normalmente mais velozes). Este argumento junto com outros (como a inconsistência da órbita do suposto cometa, ou a massa necessária) o levam a postular de que o TCB (Tunguska Cosmic Body ou Objeto Cósmico de Tunguska) foi um NEA, do grupo dos Apollo, de 90 a 190 m de diâmetro orbitando entre 1 e 1,5 UA.

No entanto, Sekanina postulava um asteróide metálico cuja resistência o teria levado a cair em Terra, fato problemático porque nunca foi achado. Nem seus remanescentes. Assim não foi fácil para a teoria ganhar adeptos. Até que 10 anos depois, Chris Chyba, Paul Thomas e Kevin Zahnle publicaram um artigo na revista Nature: The 1908 Tunguska explosion: atmospheric disruption of a stony asteroid (A explosão de Tunguska em 1908: a ruptura atmosférica de um asteróide rochoso). O argumento central deles é que o NEA que ingresou em Tunguska em 1908 foi um asteroide rochoso, bastante mais rígido que um cometa, mas não tanto quanto um meteorito metálico. Eles desenvolveram uma teoria para calcular como a presão atmosférica teria afectado o asteroide em sua entrada à Terra e concluiram que era perfeitamente possível considerar um objeto rochoso de entre 20 e 30 m de diâmetro, entrando a uma velocidade de entre 15 e 25 km/s que teria sido quebrado, literalmente esmagado, pela presão atmosférica a uma altura de 10 km produzindo uma onda expansiva que liberarou entre 10 e 20 Mtons de energia, exatamente a necessária para derrubar as árvores. Para explicar as noites brancas em Londres, os autores consideram que a onda expansiva lançou grandes quantidades de vapor de água do próprio local aonde a explosão aconteceu para alturas de 50 km . Ali os ventos estratosféricos a teriam transportado milhares de km criando núvens noctilucentes acima de Londres e demais cidades da Europa do Oeste.

O trabalho foi um marco na história de Tunguska e deu uma viarada de timão nas interpretações. Lembro ainda a repercusão quando foi publicado, a revista dedicou um comentário editorial que considerava que era o fim das controversias: Tunguska cai na Terra dizia H. J. Melosh do Laboratório Planetário e Lunar da Universidade de Arizona.

Até certo ponto a conclusão de Chyba e colaboradores é preocupante. Um asteróide de apenas 10 m de diâmetro seria capaz de devastar uma cidade. Lembremos que a energia liberada é 1000 vezes maior que a bomba de Hiroshima. E que o catálogo de NEAs da NASA, ainda incompleto, comporta apenas objetos de 1 km de diâmetro ou mais. Tunguska foi um fargmento minúsculo, impossível de se detectar com antecipação suficiente e que, de ter caido três horas depois, teria atingido a cidade de Moscou como o escritor Arthur Clarke diz no começo de sua obra de ficção científica Cita com Rama (desconheço se foi traduzido ao português ou se tem versão brasileira mas recomendo sua leitura fortemente!) Resulta bastante decepcionante reconhecer que estamos destinados a esperar que a qualquer momento uma pedrinha atinga uma de nosas maiores cidades criando um massacre.

A frequência de ocorrência de eventos tipo Tunguska foi avaliada em 1 a cada 200 a 1.000 anos. Estamos fazendo 100 anos desde a última vez que uma rocha cósmica quase destruiu a capital de um império. Estaremos prestes a testemunhar a desaparição de uma de nossas grandes capitais?

Ou existe uma terceira explicação? Talvez em Tunguska não caiu nada do céu e é por isso é que nada foi achado no solo. A esta derradeira teoria nos dedicaremos na última entrada desta série apaixonante....

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